Pequenos Americanos #01: Como um negro!


   Já faziam sete ou oito meses desde que me demiti e abandonei o Pete e a família do Maurício depois de tudo o que aconteceu. Depois disso comecei a buscar novos horizontes para mim, pensei em voltar a buscar um emprego como professor na educação infantil, que foi o que me formei para fazer. Mas parece que o meu destino era realmente ser cuidador.
   Meses depois, eu era Au Pair nos EUA, de uma família rica em nova york por meio de um programa de Au Pair, e passei a morar com a host family, a família que havia me contratado depois de muito tempo e muita conversa por Skype, e um rápido curso de inglês só para me adaptar mesmo.
   Então, eu morava na casa onde trabalhava, e dormia no quarto de hóspedes que adaptaram para mim. E a família tinha dois meninos. Um de oito anos, Noah, e um adolescente de dezesseis, Oliver.
   Já fazia mais ou menos uma semana que estava com eles. Cuidava dos dois pela manhã e mandava os dois para a escola durante a tarde, quando cuidava da casa até os pais deles, o senhor e a senhora Cooper, chegarem. Cooper é um sobrenome muito comum nos Estados Unidos, tanto quanto Silva ou Souza no Brasil.
   Mas as crianças dos Estados Unidos, assim como os adultos, são muito diferentes dos nossos. E uma dessas diferenças veio a tona numa dessas, enquanto Noah, no sofá, desenhava um avião. Era o plano dele para a vida, ser projetista de avião.
   -Você desenha como um negro! - Disse Oliver.
   Esse tipo de brincadeiras e comparações de "como um branco" ou "como um negro" era recorrente nos EUA, e entre os dois também. E nós sabemos como os americanos são muito mais racistas do que nós, ainda mais em classes sociais mais elevadas. Naquela hora não dei conta.
   -Vem aqui!
   Puxei Oliver para a cozinha.
   -O que foi aquilo?
   -O que? Foi uma piada! Ele acha que está desenhando um avião!
   -Eu sei disso, mas o que negros tem a ver com isso? Conheço negros que desenham muito bem, então não dá para rir com isso! Sua piada não é só errada, ela é fraca e sem sentido, que nem sua vida amorosa!
   -Ah, é que você é negro, né?
   -Moreno, café, nem eu sei mais! O ponto é, quando quiser zoar amigavelmente o seu irmãozinho, ou você faz como um profissional ou não faz!
   Me aproximei da porta da cozinha e falei ao corredor.
  -Você desenha como uma foca tendo um derrame! Foi o Ollie que disse!
   Eu sabia que o Noah não ligava tanto para a implicância do Ollie já a bastante tempo, porque era recorrente. E não era por mal, Noah sabia disso. As vezes, ele também provocava o mais velho do jeito infantil e as vezes até meio bobo dele. Na minha experiência, você não fala que dois irmãos se amam se alguma coisa assim não acontecer.
   No dia seguinte, Oliver passa novamente pelo Noah, ao vê-lo fazer qualquer coisa.
   -Parece uma foca tendo um derrame!
   A conclusão é que adolescentes americanos não são todos racistas. Eles só não sabem improvisar uma boa zoação entre os colegas e criar repertório.
   -Ollie, pelo seu próprio bem... - Ele me olha com os olhos claros de forma incrédula enquanto digo. - Cala a boca, você zoa como um branco!
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