Pete e o Supermercado - Pete #05


   Eu sabia que ia ser uma luta ir com o Pete até o Supermercado. Mas era necessário: A Raquel tinha deixado uma lista de compras comigo porque nem ela e nem o Maurício tiveram tempo de ir na última semana e a despensa já começava a esvaziar.
   "Qual é, seja razoável! Vai ser rapidinho, e vai ser bom para o Pete sair um pouco de casa!" Porque não é com você que ele vai, né, Maurício?
   Bem, quando você é assalariado, não tem muita escolha.
   Tirei as roupas do guarda roupa e joguei sobre a cama dele, enquanto o Pete aguardava, enrolado na toalha.
   -Vou sair para você se trocar. Mas tem que me prometer que pelo amor de papai do céu você não vai ficar pedindo tudo o que ver!
   -Eu não vou, tio!
   -Promete? - Ele tinha mesmo que prometer. Para crianças as palavras tem muito valor.
   -Prometo!
   -Então vou confiar em você! Se você se comportar mesmo, a gente vai comer na lanchonete do Supermercado depois e vou te deixar pedir o lanche que quiser, tudo bem?
   -Tá bom!
   Saí do quarto. Pelo menos, aos seis anos e meio, o Pete já sabia se vestir sozinho, o que me dava dois minutos e meio para conferir as notificações no celular sem medo de ele morrer nesse meio tempo.
   Em uma hora, eu já estava estacionando o carro no Supermercado. Foi mais ou menos uma hora até terminarmos de encontrar tudo e passar pelo caixa. Para distrair o Pete, dei a lista de compras e uma caneta na mão dele. Pedi que me ajudasse a marcar tudo o que a gente fosse encontrando. Assim, com ele suficientemente distraído, já dava para evitar a sessão de doces, a de brinquedos e mais qualquer coisa que servisse de gatilho para o Pete começar. Até que deu certo. Quer dizer, até quando nós chegamos na lanchonete, como eu tinha prometido. Nos sentamos.
   -Ok, Pete. Aqui vai ser por minha conta, e como você cumpriu o nosso combinado, você pode pedir o lanche que quiser!
   Estendi para ele o cardápio do lugar. Hora infeliz que eu tive essa ideia. Ele olhou fixo por algum tempo para as ilustrações no cardápio. E então, decidiu, apontando com o dedinho.
   -Esse!
   Quase enfartei. Ele escolheu justamente o maior e o mais caro. Era daqueles que, se você aguentasse comer tudo, você não precisava pagar. Era muito bom, assim como os outros, e Pete não tinha alergia a nada que havia nele. Mas das duas uma: Ou Pete e eu não íamos aguentar comer tudo aquilo, ou Pete ia passar mal por comer demais e eu ia perder a metade do salário que não paguei nesse lanche. Mas ele parecia empolgado pelo hamburgão.
   -Mas esse é muito grande!
   -Você prometeu! E eu me comportei!
   E eis porque o Maurício mandou que eu fizesse isso por ele. Como eu disse antes, as palavras tem valor para as crianças. E quando eu usei o termo "prometer", na cabecinha do Pete, eu estava assinando um contrato dizendo que, independente de qualquer circunstância, se ele fizesse o que eu pedi, eu ia cumprir a minha parte. E essa, senhores, é a parte dura de se ensinar honestidade para as crianças: É quando o destino te impede de ser honesto com elas só para te sacanear. Fiquei pensando naquele momento o que o Márcio faria. Na real era até meio óbvio:
   -Olha só, moleque: Se eu tiver que pagar por isso aqui, o que não entrar na sua boca vai entrar por outro lugar, tá claro?
   Ok, não, era uma péssima ideia. Só seria útil se eu pudesse ter certeza que o Pete tinha neurônios o suficiente para desistir depois de ouvir isso. Então, tinha que pensar em outra coisa.
   -Eu sei que eu prometi, mas Pete, você já aprendeu que você só pode comprar as coisas se você tiver dinheiro o suficiente para pagar o que elas valem, certo?
   -É, mas você tem dinheiro!
   Droga. Me pegou de novo. Ele viu quando eu abri a carteira para pagar as compras quando passamos no caixa. Essa era outra habilidade inconveniente das crianças: Estão vendo tudo o que fazemos, até o que a gente não gostaria.
   -Pete, vamos fazer um acordo: Se você trocar de lanche, eu prometo que além do refrigerante, eu te pago uma sobremesa!
   Ele me encarou por alguns segundos. E eu tremendo e soando frio, porque sabia que, se ele não mudasse de ideia metade do meu salário do mês ia evaporar. E então, ele finalmente dá o veredito.
   -Tá bom. - Reclama, parecendo um pouco contrariado. - Então pode ser esse? - Aponta para outro no cardápio. Finalmente um humanamente possível de comer para uma criança de seis anos.
   Assim, terminamos na maior paz possível o nosso lanche. Até que pedimos a sobremesa, como eu havia prometido. E Pete pede um pote grande de pudim de chocolate.
   Foi então que eu percebi: Para entrar na lanchonete nós passamos primeiro na parte de sobremesas e o Pete passou olhando tudo, mas a sobremesa não fazia parte da promessa. Ou seja... Ele queria o pudim de chocolate o tempo todo!
   "Nunca mais." Pensei comigo. "Nem que o Mauricio dobre o meu salário, mas eu nunca mais volto aqui com o Pete".


Postar um comentário

0 Comentários