Olavinho e a Árvore


   Estava para começar novamente o mesmo show de todo final de ano. E não é o do Roberto Carlos. Esse é tão ruim que a gente se acostuma, mesmo desgostando. Pelo menos, não é preciso se preocupar com a música ambiente das festas de fim de ano. A televisão já faz isso por todos nós. Do jeito mais mal feito possível mas faz.
   O show a que me refiro mesmo é o do Olavinho. Foi num desses natais aí de algum desses últimos anos. Não importa muito. O fato é que dessa vez as coisas iam acontecer na minha casa. Na minha família cada fim de ano era na casa de um parente diferente, e aí, cada um que lidasse com as coisas do jeito que desse.
   Como nesse ano me avisassem um pouco tarde que estavam todos os parentes, inclusive aqueles de longe, viriam para a minha casa, tive que correr as pressas ao supermercado comprar as coisas. Como ainda moro com meus pais, pelo menos não teria que me preocupar em fazer as comidas, mas o resto com certeza ia ficar para mim. O filho que fica adulto e continua na casa dos pais é para ser escravizado mesmo. É o preço do aluguel!
   Além disso, faltavam os presentes. Qualquer coisa mais ou menos para as crianças já devia servir. Talvez devesse servir amendoins também. Amendoins nunca falhavam, e até onde eu soubesse ninguém era alérgico na família. Fiz isso. Mas dessa vez, teria algo inesperado: A tia Selma traria o Olavinho.
   Todo mundo sabia que ele ia fazer alguma coisa bem séria. Sério. Todo mundo.
   Me preparei para tudo naquele dia. Terminei a noite do dia 23 de Dezembro daquele ano, enfeitando a árvore. Por sinal, uma enorme árvore com neve falsa, algumas bolas coloridas e luzes como não podia deixar de ser. Bem no jeito para o Olavinho fazer a arte dele, e derruba-la na tentativa de pegar um dos enfeites. Ele é tipo aquelas araras que não pode ver um negócio que brilha, que já quer pôr a mão! Mas não dessa vez! Fiz questão de deixa-la em cima de um móvel, onde ele não poderia alcança-la: Tiro e queda!
   Chegou o dia seguinte. O especial do Roberto Carlos na TV para a qual ninguém olhava tirando o cachorro. No quarto, o bebê dormindo (Com a música de final de ano. Triste dia para ser um bebê com sono.). Lá fora, as crianças brincando de qualquer coisa que me dava sono só de pensar em olhar pela janela para ver.
   E o Olavinho, como o James Bond que era, vindo da cozinha com algo na boca que claramente conseguiu mastigar, se aproximava da árvore. Como não tivesse me visto ali, aproximou-se. Aquele olhar de: “Que boniiiiiito! Partiu destruir!”. Se aproximou do móvel e tentou levantar a mão até uma das bolas.
   Fiquei olhando para ver no que dava. Ele começou a fazer força para subir, o que era perfeitamente previsto, e por isso garanti um móvel pesado, que não saísse tão fácil do lugar. Comecei a ver suas tentativas de subir com certo riso. Era realmente engraçado. Até que de repente um estrondo: BRUUM.
   Olhei de novo. Esfreguei os olhos. E não é que o infeliz do moleque conseguiu agarrar um dos galhos mais baixos da árvore e puxar para baixo, fazendo com que tudo caísse? Os parentes começaram a chegar, mas ninguém se aproximava. Por certo, achavam que a árvore teria caído sozinha, por obra de algum fantasma, porque mal se via Olavinho debaixo dela. E ela não se mexia. Me aproximei devagar.
   “O menino se matou!” Pensei.
   “Tudo bem, gente! É só uma árvore!”
   Me aproximei com o sorriso amarelo e fiz sinal para um tio me ajudar a levanta-la. Logo, o corpo de Olavinho aparece debaixo dela, desacordado. E, Deus me perdoe por achar isso engraçado, mas ele estava com o rosto roxo e o tal galho que ele puxou se soltara e estava preso em sua boca, quase na garganta. Tia Selma se aproximou assustada e o tirou, gritando que chamassem o médico e ora fazendo uma nervosa respiração boca a boca ora dando fortes golpes no peito do moleque. Se não estivesse morto, ia morrer ali mesmo. Mas logo, como que minhas preces sendo ouvidas, voltou a si.
   “Parabéns, moleque!” Disse Tia Selma. “Conseguiu me matar do coração! Quem deixou essa árvore aqui tão alta?”
   Alguém falou meu nome.
   “Por que isso?” A mulher me fulminou com o olhar.
   “Para caberem mais presentes em baixo! Sabe como é, tia, eu tenho o dom da organização, mas, as vezes, acidentes acontecem! Você tá bem, Olavinho?”
   Tossiu algumas fitinhas verdes daquelas que tinham no galho da árvore para simular a folhagem. Em seguida, levantou devagar uma das mãos. Uma brilhante bola vermelha nela.
   “E-eu consegui pegar!”
   “FILHO DA...”

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   O primeiro conto da versão antiga deste blog, publicado originalmente no natal de 2016. De tempos em tempos vou estar publicando alguns contos de lá, entre um texto novo e outro.

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